Por João Geraldo Lopes GonçalvesA visão glauberianaEm 1967, o Brasil vivia o terceiro ano do golpe de 64, que instaurou a Ditadura Militar. Mas ainda podia respirar um pouco de democracia. O ditador de plantão, general Castelo Branco, era tido como moderado. As Forças Armadas viviam, naquele momento, uma luta interna que deixava claro não haver acordo quanto ao futuro do País. 2p5l73
Castelo assumiu o governo prometendo fazer uma limpeza na suposta corrupção e no tal comunismo que nunca existiu. A promessa era realizar eleições livres em 1965, algo que não ocorreu. Tudo indica de que o consenso para o retorno da democracia estava longe de se concretizar.
Linha dura liderada por Costa e Silva emperrava os interesses dos moderados. Além disto, a violência do Estado só aumentava com torturas, desaparecimentos, exílios e censura. Mas mesmo assim era possível driblar as dificuldades e fazer arte.
Glauber Rocha, um cineasta baiano, vinha com uma revolução na sétima arte brasileira. O Cinema Novo apresentava o que ele chamaria de uma nova estética cultural. A realidade nua e crua vinha para as telas, misturada com poesia, música e teatro. Uma estética que não abria mão de expor a miséria humana e social.
“Terra em Transe” foi o filme que abriu corações e mentes de muita gente. Caetano Veloso viu nele a face de um país tropicalista entre a luta de classes, envolto ao velho e carcomido e a necessidade do novo e inovador. A película não só escrachava a ditadura militar civil empresarial, como questionava a política.
Glauber nos faz pensar nos delírios construídos por políticos. Estes delírios recheados de hipocrisia, cinismo, egoísmo. O papel da religião como esteio e abrigo para politicagem seja da direita, da extrema e até de setores esquerdistas. Em uma cena em que um candidato está na periferia pedindo votos, ficam claros estes delírios.
Um senhor pobre diz que o seu desejo era comer, pois sua família ava fome, vivia na miséria. Por este discurso foi chamado de extremista. O filme mostra os delírios que atingem o jornalismo, que não sabe se coloca em apoio a verdade ou aos interesses de grupos econômicos.
Cheio de metáforas não pode ser visto apenas com um olhar de 67, mas para o de hoje. Para escrever este texto, o vi acho que pela vigésima vez. Ele traça um quadro muito atual da política brasileira. As delirantes peripécias de personagens até caricatos nos levam ao caos. Glauber Rocha é muito, mas muito necessário neste Brasil polarizado.
Delirar leva a morte, nos retira da razão e da emoção. Atira-nos a aventuras com sangue e sem volta.
Nota: O filme Terra em Transe pode ser assistido no Youtube e no Globoplay.
Delírios: nós ainda estamos aqui 2a4t2k
O Brasil vive um período de completo delirante caos. De um lado, uma extrema direita que delira com atos e ações e revisionismos e negação da História. Do outro, uma esquerda que se mostra desorganizada e perdendo liderança entre os pobres. Os delírios nos levam a intelectualizar o tal pobre de direita, criando uma nova classe política e social.
O estado delirante nos faz esquecer dos perigos de um retrocesso político em nossa História. Não se trata de rir de bolsonarista rezando para um pneu ou convocando ETs para uma conversa. Trata-se de ameaças a nossa soberania, nossa liberdade como povo e como indivíduo. Os delírios já levaram os atentados a bomba e tentativa de golpe de estado.
Assassinatos políticos e incentivos a violência de gênero, raça, credo e por aí vai. O povo brasileiro mostra ao longo da história sua capacidade de resiliência e resistência. amos 21 anos de Ditadura. Seis anos de extrema direita destruindo conquistas e matando pessoas. Mas às vezes nos deixamos ser pegos pelos delírios.
No filme premiado no Oscar, “Ainda Estou Aqui”, o clima delirante de um regime tenta desconstruir uma família. Ao assisti-lo, nos deparamos com o fato de um regime autoritário que não interesses apenas políticos ou econômicos.
Buscar com seus delírios violentos destruir relações familiares, de amizades, laços profundos de amorosidade e carinho. Cenas da prisão do deputado Rubens Paiva mostram esta face da ditadura. Levado pelos militares sem a família saber o porquê, esta mesma fica refém dos trogloditas em sua própria casa.
Tal situação busca desestabilizar um lar repleto de amor, paz e solidariedade. Em outra cena, Eunice Paiva, também presa, vive um momento nos porões imundos do regime, entre gritos e choros dos presos políticos, um verdadeiro inferno de Dante, capaz de levá-la à loucura.
De volta para casa, se vê sem marido, sem dinheiro, com cinco filhos para criar. Eunice não permite que o mundo desmorone. Ela enfrenta o regime que ainda insiste em perturbá-la. Cabe a ela a tarefa de bater de frente com estes delírios.
Com amor, ternura e muita coragem, ela enfrentou as botas e as baionetas dos generais. Sabia que a vida tinha que continuar. Volta a estudar, cria seus filhos, vai fazer militância nos direitos humanos, e não desiste de saber o que fizeram com seu marido.
Em uma cena marcante, a revista Manchete, aliada da ditadura, quis fazer uma reportagem sobre o desaparecimento de Rubens e no final dela tirar uma foto da família. O jornalista queria que todos fizessem caras de derrotados, de enterro. Eunice Paiva trava um pequeno debate com o rapaz e diz para a família: “sorriem, todos sorrindo”.
Porém, um clima de loucura delirante está à espreita novamente. Desta vez com um certo apoio popular, conquistado a partir de mentiras e fundamentalismo religioso e político. Espero que possamos dizer a estas forças malignas:
Nós ainda estamos aqui!
Nota: “Ainda Estamos Aqui”, filme de Walter Salles, com Fernanda Torres no papel de Eunice Paiva, está nos cinemas, inclusive em Limeira. Penso que para vencer os delírios golpistas e de ódio, a película é, sem dúvida, um elixir para rebobinar nossas forças contra as ameaças a democracia e a família.
Lançamento de obra literária 5t6a5j
É preciso que a História seja registrada a partir da visão dos pobres e excluídos. Durante décadas, a versão que tínhamos dos fatos era a dos vencedores, ditaduras e conservadores. Não só para relembrar o ado, mas como resgate da memória coletiva e individual.
A memória é, sem dúvida, importante para trazer à verdade e a justiça à tona. Foi neste sentido que eu e o professor José Claudinei Lombardi, o Zezo, escrevemos o artigo “Contribuição a memória da esquerda no interior conservador do Estado de São Paulo”.
O texto faz parte da coletânea “Uma História das Esquerdas no Interior Paulista”, organizada por Fabiana Junqueira e Rodrigo Molina. A obra terá seu lançamento neste sábado, dia 15 de março.
Será na sede do Sindicato dos Trabalhadores Municipais de Piracicaba. A solenidade se inicia às 10h30, na Rua Ipiranga, nº 553, Centro, Piracicaba. Participem!
Um bom fim de semana a todas, todos e todex.
João Geraldo Lopes Gonçalves, o Janjão, é escritor e consultor político e cultural.
Os artigos assinados representam a opinião do(a) autor(a) e não o pensamento do DJ, que pode deles discordar
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